Na última semana foi revelado o percurso do Tour de France 2023 que comentamos aqui, uma das etapas em especial é carregada de história e merece destaque, a etapa 9.
Saint-Léonard-de-Noblat é uma cidadezinha rural a leste de Limoges com pouco mais de quatro mil habitantes e será largada da etapa 9 do Tour de France 2023 em homenagem a seu ciclista mais famoso, Raymond Poulidor. A chegada que encerra a primeira semana do Tour será no Puy de Dôme.

A palavra Puy vem do latim pódio que significa lugar alto e Dôme de Dumiu que significa cume. O Puy de Dôme é um vulcão extinto (última erupção datada de 5.760 antes de Cristo) no maciço central francês onde no topo há um laboratório de meteorologia bem próximo a Clermont-Ferrand. Desde 2012 a estrada está fechada para ciclistas e veículos (exceto de emergência).
Com três rotas de subida, a organização escolheu subir a partir de Clermont-Ferrand onde a escalada tem 13,3km com 7,7% de inclinação média. A escalada começa leve, fica moderada e tem um alívio entre o sexto e sétimo quilômetros, onde começa o trecho interditado com inclinação superior a 10% e segue assim até o topo. Confira o perfil altimétrico detalhado pelo Cols-Cyclisme.com:

Em 2023 o Puy de Dôme aparecerá no Tour pela 14ª vez desde 1952 tendo sido vencido pela primeira vez por Fausto Coppi. Além da história que você lê na sequência, outra curiosa aconteceu no Puy de Dôme.
O Eterno Segundo
Falecido a três anos aos 83 anos, Raymond Poulidor o “Pou-Pou” (Pu-Pu) foi um ciclista de origem muito humilde onde com seu talento natural conseguiu duelar com grandes estrelas do ciclismo. Vencedor de sete etapas do Tour de France e da classificação geral da Vuelta, Pou-Pou venceu provas importantíssimas como o Critérium du Dauphiné, a Paris-Nice e a monumento Milão Sanremo. Contudo, Poulidor nunca vestiu a camisa amarela do Tour e por esse “feito” ficou conhecido como o Eterno Segundo.
O motivo era claro, Poulidor foi contemporâneo de Jacques Anquetil e mais tarde de Eddy Merckx, dois monstros do ciclismo que acumularam cinco títulos cada do Tour de France além de 16 vitórias de etapas para Anquetil e 34 para Merckx. Conheça abaixo a história de Raymond Poulidor:
Puy de Dome de 1964
O ano era 1964, Jacques Anquetil era o tricampeão do Tour e considerado uma estrela enquanto Raymond Poulidor, um caipira que tinha um talento natural e ganhou o coração da torcida francesa. Na última etapa de disputa pela camisa amarela a chegada era no Puy de Dôme, local próximo a Saint-Leonard-de-Noblat cidade natal de Poulidor e que será palco da largada da etapa nove em 2023.
Anquetil tinha 56 segundos de vantagem na classificação geral, era o duelo entre o talento natural e força do jovem Poulidor contra a experiência e estratégia de Anquetil. Poulidor tentou três vezes largar Anquetil até que na quarta tentativa, Anquetil sobrou. Poulidor venceu e Anquetil chegou quase desmaiando e apenas perguntou: – Quanto?
A resposta veio: Você manteve quatorze segundos, o campeão então pode comemorar: – É mais do que eu precisava.
Na etapa seguinte em um contrarrelógio chegando no velódromo do Parcs de Prince em Paris, Anquetil foi mais rápido que Poulidor e conquistou seu quinto Tour de France por 55 segundos, a menor margem de vitória até então.
Poulidor nunca vestiu em competição a camisa amarela, nunca esteve tão próximo e essa foi uma das mais épicas batalhas em mais de um século de Tour de France. Poulidor disputou 14 edições do Tour de France, obtendo três vezes o segundo lugar e cinco vezes o terceiro lugar.
Mathieu van der Poel
O ciclismo definitivamente é um esporte que é transmitido entre gerações, Poulidor casou com Gisèle e viveu a vida toda em Saint-Léonard-de-Noblat a leste de Limoges. Sua filha Corinne casou-se com o ciclista Adrie van der Poel que foi campeão mundial de cyclo-cross e multivencedor da Amstel Gold Race. Os dois netos de Pou-pou tornaram-se ciclistas, David o mais velho com uma carreira discreta e Mathieu van der Poel, tetracampeão mundial de cyclo-cross, vencedor de diversas provas no ciclismo profissional como a Tour de Flandres, Strade Bianche e Amstel Gold Race.

Em 2021 Mathieu participou do Tour de France, sua equipe com autorização da organização e da UCI preparou uma camisa especial inspirada nas cores da usada pelo avô. E logo em sua primeira participação, Mathieu conseguiu o que o avô perseguiu por toda uma carreira, vestiu a camisa amarela após vencer segunda etapa do Tour de France 2021.
