O mundial de ciclismo de estrada está acontecendo nesta semana na Bélgica, mais precisamente na região Flandres Belgas. Um dos locais com maior investimento em infraestrutura para ciclistas no planeta.

Mobilidade é investimento
Com uma população de 6,4 milhões de pessoas (equivalente ao Rio de Janeiro ou pouco mais da metade da cidade de São Paulo), os Flandres possuem 2.650km de ciclovias de uso exclusivo e um investimento equivalente a 1,8 bilhões de reais por ano em infraestrutura para o ciclista até o ano de 2024. Em comparação a cidade de São Paulo investiu entre 2012 e 2016 cerca de 80 milhões (4%) e desde então o investimento caiu para R$135.000 ao ano em 2018. Não é pouco, é muito pouco.
Exemplo de ciclovia segregada nos Países Baixos:
https://web.facebook.com/dutchcyclingembassy/videos/1166484493813436
Ao criar infraestrutura para bicicletas nas cidades, reduzir a velocidade dos automóveis e eliminar vagas de estacionamento, a Bélgica cultiva a mentalidade do ciclista de amanhã. Ou seja do indivíduo que cresce acostumado a ter a bicicleta como opção. Os ganhos são inúmeros:
- Menor emissão de poluentes, resultando em melhor qualidade do ar das cidades.
- Maior percentual de adultos fisicamente ativos, combatendo o sedentarismo.
- Menos espaço e custo para guarda de veículos.
- Consequente menor custo de ampliação de vias e obras viárias.
A realidade brasileira patina mesmo na cidade com maior infraestrutura cicloviária do país
Enquanto isso em São Paulo, a propaganda vai lembrando que o ciclista possui 652km de ciclovias a disposição. Só não lembra que além de representar apenas 3,8% da quantidade de vias da cidade, a vasta maioria das ciclovias não são segregadas.
Ou seja o ciclista precisa conviver com um veículo em alta velocidade passando a poucos centímetros de seu corpo. A reação natural é que menos pessoas utilizem a bicicleta nessas ciclovias. E geralmente essas ciclovias com menor segurança são aquelas localizadas em locais de menor renda, ou seja o pobre sofre. Essa insegurança foi captada por uma pesquisa realizada pela Ciclocidade em 2016. Mais de 40% das entrevistas achavam muito perigoso pedalar em vias compartilhadas e 25% sentiam o mesmo temor em ciclovias e ciclofaixas.

O próprio material de divulgação da semana de mobilidade em São Paulo, utiliza a imagem de um caro de viadutos voltado especialmente para o transporte por veículos a combustão. A preocupação com a mobilidade a pé ou de bicicleta é praticamente nula.
É a partir desse ponto que podemos compreender a dificuldade em promover a mobilidade de forma ativa em grandes cidades. Dados da utilização de bicicletas no Brasil indicam que apenas 1% das viagens em cidades com mais de 1 milhão de habitantes são feitas de bicicleta. Enquanto isso cidades com menos de 100.000 habitantes tem cerca de 6% das viagens em bicicleta.

Na esteira do crescimento do uso da bicicleta na última década os atropelamentos de ciclistas disparou de 1.064 mortes em 2012 para 1.545 em 2018 (dados da Abramet). A redução da velocidade em vias urbanas é um caminho mundial. Nova Iorque nos EUA, Paris, Londres, são algumas das cidades que reduziram a velocidade máxima do automóvel nos últimos anos para 30km/h. Enquanto isso no Brasil, além da velocidade urbana chegar a 90km/h em muitas cidades. Ainda há falta de controle e ausência de campanhas educativas.
A cada 1km/h a menos na velocidade da via, há uma redução de 4% do risco de morte e 3% no risco de sinistro grave de trânsito. A propósito nós aqui no pelote ciclismo não utilizaremos mais o termo “acidentes” de trânsito, pois a norma brasileira ABNT NBR10.697/2020 determina a utilização do termo “sinistro de trânsito”, afinal o termo acidental implica na ausência de culpa, fato que raramente acontece.