Durante o Tour de France muito se falou sobre as cetonas o suplemento que promete maravilhas no transporte de oxigênio pelo organismo. Seria doping ou superalimento?
A criação do suplemento de monoéster de cetona (Ketone em inglês) é creditada a empresa HVMN (lê-se humano em inglês ) de Geoffrey Woo. Dietas cetogênicas são compostas de larga base de gordura e baixa em carboidratos para promover a criação natural de corpos cetônicos pelo organismo e assim acelerar a queima de gordura. Já em atletas cujo índice de gordura corporal é baixíssimo, o uso do suplemento acaba por evitar o que chamamos de “prego de fome” e refletindo em um maior desempenho do esportista.
“Não é gordura, não é proteína, não é carboidrato, mas abastece o corpo com energia” diz Geoff Woo, co-fundador da startup HVMN
Os estudos utilizados pela HVMN para amparar seu produto indicam que não há melhora no rendimento do exercício mas aumenta a oxidação de gordura.
O que são Cetonas
Cetonas são uma fonte de energia produzida pelo fígado durante períodos de baixa ingestão de carboidratos, portanto uma fonte endógena de energia. A versão sintética das cetonas é portanto uma versão exógena de energia. Ao ingerir cetonas por via oral, preserva-se o glicogênio, a principal reserva de energia do organismo. Seu uso não é considerado doping pela WADA (Organização Mundial Antidoping) justamente por não levar ao aumento do rendimento efetivo e sim funcionar como um alimento.
O consumo de uma dieta cetôgênica leva a produção natural de corpos cetonicos, mas leva semanas para isso ocorrer, a ingestão de um suplemento ativa de forma quase instantânea a cetose.
O funcionamento das Cetonas no organismo
Quando o atleta está desempenhando a atividade física, o corpo busca energia no glicogênio cuja fonte de energia são os carboidratos. Após algum tempo o corpo passa a consumir gordura com o fígado criando corpos cetônicos que direcionam o consumo de gordura para o organismo ao invés do glicogênio. Assim o uso do suplemento previne o que chamamos de “prego de fome” permitindo uma maior reserva de energia ao esportista.
Contudo a qual custo? Assim como uma dieta cetogênica, a principal reação a seu uso é a halitose, visto que parte dos corpos cetônicos acabam sendo liberados pelo hálito enquanto os demais pela urina. Pode causar aumento do colesterol, do ácido úrico no sangue, dores de cabeça e cansaço. Outro efeito conhecido é o mal estar gastrointestinal (já reparou a quantidade de ciclistas que abandona provas por esse motivo?), a famosa dor de barriga. Atualmente os suplementos são vendidos por cerca de 4 dólares por dose.
MPCC não aprovou o uso de cetonas
Criado em 2007, o MPCC é uma organização de equipes e ciclistas em prol do ciclismo limpo. Atualmente dez equipes WorldTour e dezoito ProTeam além de mais de 300 ciclistas e equipes continentais fazem parte do coletivo. A organização entende que as equipes e atletas não devem utilizar a substância em função da ausência de estudos e pesquisas de longo termo. Thibaut Pinot que compete pela Groupama-FDJ declarou que o pelote worldtour agora compete em “duas velocidades”, numa referência às equipes que utilizam cetonas como a Jumbo-Visma.
Uma pesquisa realizada na Austrália indicou ausência de ganhos de performance e todos os participantes do experimento relataram problemas gastrointestinais e náusea.
“Todos querem uma resposta simples, mas os mecanismos do organismo são demasiados complexos para permitir isso, especialmente durante a atividade esportiva. Nesse momento a espera de resultados mais concludentes, deveria prevalecer o princípio da precaução.” disse Louise Burke, pesquisadora do Instituto Australiano de Esporte.
Como o uso dos suplementos cetôgenicos é recente e sem estudos de longa duração, seu uso é considerado experimental assim como o MCT que são suplementos triglicerídeos de cadeia média, onde estimula a cetose.
A dieta cetogênica
Usada desde a Grécia antiga e desenvolvida no início do século passado, a dieta cetogenica foi utilizada para combater os sintomas da epilepsia, ao longo do tempo foi desusada pela adoção de drogas anti-convulsivas. Nos anos 90 o produtor de cinema Jim Abrahams levou para o documentário Pela vida do Meu filho (First do no Harm) seu drama pessoal com o filho e como a dieta cetogênica ajudou no controle das convulsões. Houve então um crescimento rápido de estudos sobre a dieta para combate a diabetes do tipo 2 e emagrecimento, com o uso chegando a mais de 70 paises em 2007.
Bibliografia:
Nutritional Ketone salts increase fat oxidation but impair high-intensity exercise performance in healthy adult males.
(Trevor O’Malley, Etienne Myette-Cotte, Cody Durrer e Jonatahn P Little)
Nutritional Ketosis Alters Fuel Preference and Thereby Endurance Performance in Athletes
(Peter J. Cox, Tom Kirk, Tom Ashmore, Kristof Willerton e outros)
Ketone Diester ingestion Impairs Time-Trial Performance in Professional Cyclists
(Jill J. Leckey, Megan L. Ross, Marc Quod, John A. Hawley e Louise M. Burke)
On the Metabolism of Exogenous Ketones in Humans
(Brianna J. Stubbs, Pete J. Cox, Rhys D. Evans e outros)